O POEMA #08
você
escrevendo
com outro
nome
e eu
clicando
no about
você
não
dorme há
duas
semanas
desde
que eu te conheci
dreamisdestiny
teus
olhos
caídos em novembro
e
a boca carnal
e
vermelha
e
aberta
e
o cabelo trançado
her
friends
e ela;
gosta
tanto de poema
e
misturar línguas
e
eu também
dizem:
do cabelo
da bisavó
pingava
mel,
recém
pintado de abelhas
mãezinha
do céu
falou
assim:
daquelas
histórias tão açucaradas
na voz
calma
vó índia
mãe doce
chamavam
O SEM TÍTULO 9
tua
língua e a minha
dançavam
ao lado
das duas
bocas
e os lábios
COSME & DAMIÃO
Em frente à
igreja dos pretos –
a velha
igreja do Rosário
– batem o
tambor &
jogam
essência de criança no chão.
O homem
mais velho dizia que
naquela
roda só dançava mulher
e ria,
dizendo:
“tô
cantando pra Cosme & Damião,
será que
ele não vai brincar?”
E
brincava.
Depois do
porão e da poesia,
E todos
falando.
Embora
falar seja verbo transitivo, com entrada dos dois lados
e poesia
não se
explique:
Explico:
Queria
falar dizendo,
mas estou
numa poesia.
(Se ajeita
eu-lírico.)
E tudo
roda.
POR
ENQUANTO NÃO HÁ PREVISÕES DE MUDANÇA,
PODE SER
QUE MORRA NA VOLTA
Jailson Kokeru dizia naquela tarde azul
que nasceu na cidade da Praia, Cabo Verde,
onde todos falavam português quatro horas por dia
(na escola) e crioulo na vida.
Os homens mais ricos daquela região
ainda andam sujos do serviço.
Dizia que em Angola e Moçambique se fala o português como
unidade
e alguns dialetos em paralelo.
Naquela tarde azul descobri que Cabo Verde ainda guarda
heróis
mais cheios de vida do que Vascos da Gama, Tiradentes
ou escritores em língua portuguesa de Portugal.
Falamos brasileiro, ora pois.
Isso não é um poema.
(Você sabe exatamente como eu fico.)
Já botei os dedos cruzados entre a boca e disse:
- Eu preciso dar um grito!
É isso.
- Leoa!,
é como te chamam quando cerra esses
dentes
e fecha essa cara e pende
as sobrancelhas castanhas
e joga a juba para os lados e fuma
ou quando olha pra cima, vendo
o fogo pegar nos teus braços
e aponta pra mim e diz
: tu!
E os teus quilômetros de pescoço
e os teus lábios de Brando
e os nossos óculos iguais
e o que você queria que eu dissesse
com teus cabelos surrados?
O corpo curvado e a promessa dos
seios;
O que?
(Toda roupa lhe cai bem,
assim como as palavras.)
E quando eu digo que odeio
Copacabana
você me agarra a boca e ri.
Eu sei de todo o teu corpo
(menos onde nasce esse sorriso
e como isso flutua no meu corpo
como a fumaça do Marlboro
vermelho (como a nossa pele)).
Desconcertante é a voz da jovem poeta Anelise Freitas, habitante da
zona da mata mineira. Estreou em 2011 com a coletânea Vaca contemplativa em terreno baldio (Aquela Editora), publicando
em 2013 O tal setembro (Os 4
Mambembes). No momento, prepara a plaquete Pode
ser que eu morra na volta (Edições Macondo). Reside em Juiz de Fora, onde é
mestranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da UFJF e um dos
membros do Grupo de Performances Poéticas ECO. As imagens são do singular
fotógrafo Eustáquio Neves, mineiro de Juatuba radicado há anos em Diamantina, inventor
de narrativas visuais que fundem elementos díspares, negros e brancos, urbanos
e rurais, sagrados e profanos, numa permanente exploração das fronteiras entre
as dimensões objetiva e subjetiva da vida cotidiana.
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