Peleja
Todo dia é segunda-feira,
e não sei como começar.
A poesia não chega.
Ensaio e me distraio
e me retraio e nada.
Não consigo capturar.
Capitulo, engolindo seco.
A poesia me olha
e tenta me captar,
a conta-gotas,
em tudo quanto há.
A poesia tem porta aberta,
e me acanho e me assanho,
mas não consigo entrar.
Faço reverência.
Digo que volto.
Dou voltas.
A poesia está.
Eu é que preciso (me) encontrar.
Gosto de infância
A infância me veio à boca,
doce e amarela, em linhas,
uma, duas, várias vezes.
Tem caroço
e nem quero moço;
só a mangueira,
os pés de galho em galho,
pisa aqui, segura ali
até mais alto,
onde só chega
quem sabe ser pequenino.
(Des)ilusão
Ficou à espreita
de algum fato,
algo inusitado,
sonho encantado.
Restou estreita...
ausente, renitente,
ignorou presente -
tempo premente.
A vida, um vão,
querendo longe,
perdeu o bonde,
sem nunca ter tido
o que estava à mão.
(In)quietude
Se doeu, amargou, sangrou,
aquiete-se.
Quando se está mais sem lugar
é que o infinito acontece.
Apontamentos
Pronta pra morrer,
assim, já posso
viver.
Sem apego, nem desapreço,
tudo na medida que é,
no ponto do instante -
não menos, nem além,
nada exato, matemático.
A vida em fogo... brando?
Olhai os lírios e os campos!
Contemplai réus e santos!
Todo juiz tem seu manto,
tudo flui em jogo manco,
em canto, pranto e espanto.
Há quem chega num piscar,
outros tardam o alcançar.
- Se há saída? Só navegar!