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sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Sete poemas e uma anotação de Waldo Motta





  
POIESIS   

MITOPOIESIS
METAPOIESIS
AUTOPOIESIS
 (2012) 



EFEITO SECRETO

Um poema age no mundo
mesmo que ninguém o leia.
Atua em segredo e fundo,
tudo enreda em sua teia.           

(02.06.2012)


SENHA

hora propícia
porta do fundo
chave na mão

(02.01.2012)






 AOS PÉS DA COBRA GRANDE

Iconha ou Jacaraípe?, hesita Drida,
mais para dríade desencantada, este sábado,
neste bosque de solidão, Jardim da Penha.
Iconha ou Jacaraípe? Que importa aonde ir?
Sortearemos a sorte da própria sorte!
Recorramos ao oráculo, mas aperta um, primeiro,
e tratemos de secar este litro de conhaque.
A sorte há de sortear-se por meio de nossas mãos,
nossos pés volitivos dançarão roteiros ébrios,
regidos com rigor pela música das esferas.
Que importa aonde ir este final de semana?
Que importa aonde ir em qualquer tempolugar?
Que importa aonde ir? Vamos beber e fumar!
Ouroboros sempre há de morder a própria cauda,
ciclo do tempo, círculo fechado, eterno circo.
Assim ou assado seja, Ará Mbói! Arô Moboi!

(10/09/1986)



PEGAÇÃO SAGRADA

Põe tua mão aqui debaixo
de minha coxa, onde Abrahão
pediu que um servo o tocasse,
em nome do Deus dos deuses,
Senhor dos Céus e da Terra,
onde o anjo do Senhor tocou
o relutante Jacob, que assim
se transformou em Israel,
que lembrou da sagrada aliança
em seu leito de morte, onde pediu
ao mais amado filho que o tocasse
no mesmo lugar sagrado e consagrado.

(30/07/2009)





 SENHA

porta do fundo
hora propícia
chave na mão

(02.01.2012)


REPENSANDO MALLARMÉ



Não li todos os livros, mas já sei
que a carne é alegre, e o espírito
tem sido um tolo e desastrado rei
que nem sequer conhece o seu palácio.
Fugir, fugir, para onde? Nem as aves
são livres neste mundo; eu não irei
para lugar nenhum, deixem-me aqui.
Não há por que fugir, e nem de quê.
O jardim que anelo está em mim,
nesta ilha central, e o mar é o amor.
..............................................................

(2012)





POESIA: REVELAÇÃO 




Tenho falado muito de poesia como construção, criação de realidades, pessoais e sociais, históricas, e não apenas poemas, objetos estéticos. Insisto numa perspectiva mágica, uma ação criativa e transformadora da vida e seus impasses. Poesia: arquitetura, engenharia; criação e transformação da história.

Enfim, a poesia como um processo. E também produto. Mas sempre um fazer, uma ação ou realização humana, via palavra (e outros códigos, por que não?).
Entretanto, quase nada falo do outro lado: a revelação.
Sem negar o quanto possa ter de místico, é preciso entender que a revelação não precisa necessariamente ser de coisas, fatos ou verdades de outro mundo, fora ou longe do nosso. Conhecemos tão pouco da realidade dada, herdada, ao alcance de nossos sentidos, tão limitados e confusos.
Existe muita mistificação em torno do fenômeno da poesia, como se a inspiração fosse algum recado de outro mundo. Pode até ser, em casos raríssimos, mas ninguém que eu saiba está disposto a adotar a poesia como religião, exceto talvez este que vos fala. Inspiração, para mim, não precisa ser mais que percepção, acesso - intuitivo, acidental ou metódico - a informações guardadas na memória da humanidade. 









Autor dos poemas de Bundo (Editora da Unicamp, 1996) e Transpaixão (Edufes, 2009), entre muitos outros de uma obra que começou a ser publicada em 1980, o vulcânico Waldo Motta (1959), capixaba de São Mateus e morador de Vitória (ES), é presença desconcertante no cenário contemporâneo, desordenando a ordem artificial das coisas estabelecida pelos estabelecidos e fazendo, com ânsia dionisíaca, seu próprio "carnawaldo". Os poemas e a anotação aqui publicados saíram direto do laboratório do poeta em "waldópolis", onde "waldeus" trama seus novos poemas para um novo livro. As imagens são do não menos inquieto Renato Pontello, jovem artista plástico capixaba radicado em São Paulo que vem invadindo as ruas do mundo com seu grafite altamente elaborado.  



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